A publicação do Decreto-Lei n.º 335/72 respondeu a uma pretensão dos farmacêuticos com várias décadas, que há muito exigiam a constituição da sua Ordem, tal como aconteceu com advogados (1926), engenheiros (1936) e médicos (1938).
As comemorações dos 50 Anos da Ordem dos Farmacêuticos, que terão a sua maior expressão num evento a decorrer no próximo mês de novembro, não são apenas um momento de celebração da criação e do continuo funcionamento desta instituição, mas também o mote para discutir o futuro da profissão farmacêutica e os desafios que se impõe na área da Saúde.
Apesar dos 50 anos, as origens desta que é a quarta Ordem profissional portuguesa mais antiga são bem anteriores a 1972.
Remontam a 1835, quando um grupo de 36 farmacêuticos motivados
pelas novas correntes políticas liberais, e sob a proteção da rainha D. Maria
II, reúne na Botica do Hospital de São José, em Lisboa, para fundar a Sociedade
Farmacêutica de Lisboa, que três anos depois, com influência por todo o país muda a designação para Sociedade Farmacêutica Lusitana.
Os farmacêuticos membros da Sociedade desenvolveram então ações
notáveis nas áreas científicas e na Saúde Pública, contribuindo assim para o prestígio
da classe farmacêutica e da própria Sociedade. Consultando a imprensa da época, é possível destacar as ações de análises das águas dos chafarizes de
Lisboa, do Aqueduto das Águas Livres e de várias termas existentes no país e a
análises de plantas de café e cacau vindos de São Tomé. Estes farmacêuticos
conseguem também ver aprovadas a proibição de utilização de tachos de cobre em
casas de pasto, de aparas de chumbo na lavagem de garrafas e também a proibição
do fabrico de remédios secretos, sendo ainda nomeados peritos em tribunal em
casos de envenenamento.
Após passagem por vários locais, como o Convento das
Carmelitas Descalças ou o Convento de São João de Nepomuceno, o edifício sede
da Sociedade é finalmente construído através donativos de todos os
farmacêuticos e inaugurado em 1901 na rua Nº4 do Bairro Camões, sendo esta
posteriormente renomeada como Rua da Sociedade Farmacêutica através de proposta
da Camara Municipal de Lisboa pelo reconhecimento dos serviços prestados à
cidade.
Em 1929 o Estado Novo Corporativo exige às Sociedades Científicas
e às Associações Profissionais a sua transformação em Sindicatos sob pena de
serem extintas caso não o aceitem.
Os farmacêuticos reagem negativamente a esta imposição e
exigem a sua transformação em Ordem à semelhança dos advogados e dos médicos,
no entanto tal pretensão não é aceite pelo Estado e a Sociedade é encerrada,
voltando posteriormente à atividade já como Sindicato Nacional dos
Farmacêuticos.
A direção do Sindicato herda a motivação da antiga Sociedade
e prossegue o seu trabalho, conseguindo ver aprovadas, entre várias outras,
duas leis fundamentais para a profissão farmacêutica: a Lei nº 2125 sobre a
Propriedade da Farmácia e o Decreto-Lei Nº 48547 que regula o exercício
farmacêutico, contendo este diploma um capítulo que já é um verdadeiro código
deontológico
O desejo dos farmacêuticos em terem uma Ordem profissional
não é esquecido e é em 1966 que, graças a influências políticas bem-sucedidas,
é publicado o Decreto-Lei Nº 46997 que contém já matéria legislativa com
carácter de Ordem: obrigatoriedade de inscrição para o exercício da profissão
farmacêutica; emissão de carteira profissional e criação de títulos de
especialista: Análise Clínicas e Indústria Farmacêutica.
Em 1972, após a morte de Salazar e a subida ao poder de
Américo Tomaz, é aprovado o Decreto-lei Nº 334/72 que cria formalmente a Ordem
dos Farmacêuticos, que sucede nos direitos e obrigações patrimoniais ao
Sindicato Nacional dos Farmacêuticos agora extinto.
Esta alteração foi precedida por um plesbicito à classe, que
se pronunciou favoravelmente transformação em Ordem, justificada por dois
motivos fundamentais: “o interesse público, como atividade sanitária, da função
exclusivamente cometida aos farmacêuticos, de preparar, conservar e distribuir
medicamentos ao público” e “a autonomia técnica da atividade profissional, que
implica a existência de preceitos deontológicos específicos e de estrutura
disciplinar autónoma”, pode ler-se no diploma que criou a Ordem dos
Farmacêuticos.
Assim, em dezembro de 1973, realizaram-se as eleições
promovidas pela comissão administrativa da Ordem, tendo a primeira reunião dos
corpos diretivos decorrida em janeiro de 1974.
A Ordem dos Farmacêuticos é assim a legítima continuadora da
Sociedade Farmacêutica Lusitana, acumulando 187 anos de uma história escrita
diariamente por todos os farmacêuticos e pelos dirigentes, que modelaram a
profissão e projetaram a sua importância como garante da qualidade dos cuidados
serviços prestados aos cidadãos.