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Odette Ferreira (1925-2018) – Notícias

A Ordem dos
Farmacêuticos manifesta o seu profundo pesar pelo desaparecimento de um dos
seus mais ilustres membros. Odette Ferreira foi umas das mais proeminentes
farmacêuticas do nosso tempo, com uma dedicação ímpar à profissão, à ciência e
aos mais desfavorecidos. Sempre com enorme orgulho no seu título de
farmacêutica, deixa uma marca indelével na profissão, pelo prestígio, pelo
exemplo, pelos princípios e conhecimentos que transmitiu, enquanto professora,
a várias gerações de farmacêuticos, que hoje a revêm como exemplo.

Em nome de todos os
farmacêuticos portugueses, a Ordem dos Farmacêuticos dirige as mais sentidas
condolências à família e amigos, e reitera a enorme gratidão por toda uma vida
e obra que ficam perpetuadas no seio da classe.

NOTA BIOGRÁFICA 

Maria Odette Santos
Ferreira nasceu em Lisboa, a 4 de junho de 1925. Licenciou-se em Farmácia no
ano de 1970, doutorou-se na Universidade de Paris Sud, em França, e chegou a
Professora Catedrática de Microbiologia em 1987. A sua vida foi uma missão ao
serviço da Universidade de Lisboa e do Serviço Nacional de Saúde na área da
infeção pelo VIH/sida.

Na década de 70
iniciou a sua colaboração com o Instituto Pasteur de Paris e utilizou a
lisotipia de pseudomonas aeruginosa para efetuar o estudo epidemiológico das
infeções hospitalares provocadas pelo bacilo piociânico, observadas nos
hospitais de Lisboa. Os seus estudos conduziram à identificação de uma
proporção bastante elevada de estirpes portuguesas (20%) que não eram
tipificáveis pelo sistema de lisotipia de Lindberg, utilizado como sistema de
base para a lisotipia do bacilo piociânico.

Na década de 80,
trabalhou de forma continuada com o Instituto Pasteur de Paris, Unité
d’Oncologie Virale com o Prof. Luc Montaigner, onde desenvolveu treino nas
técnicas de deteção do lymphadenopathy AIDS virus (LAV). É desta forma que,
mais tarde, consegue proceder ao isolamento do 2.º vírus da SIDA- LAV 2, num
doente guineense internado no Hospital Egas Moniz.

Em 1982, num período
de estadia no Instituto Pasteur de Paris, em colaboração com o Prof. Leon le
Minor, no Laboratório de Lisotipia Entérica, estudou 62 estirpes de
acinetobacter calcoaceticus isoladas em Lisboa em algumas unidades hospitalares.
Este trabalho, permitiu definir os lisotipos das estirpes hospitalares
portuguesas e redefinir um novo tipo lisotipo (lisotipo n.º 104).

Também nesta altura,
isolou um novo bacteriófago (fago acinetobacter 82-14) ativo sobre uma estirpe
portuguesa. Este fago foi referenciado no Advances Virus Research, assumindo-se
que esta descoberta viria a ter implicações filigenéticas e taxonómicas.

A partir da década de
80 toda a sua atividade científica se centrou no estudo da infeção pelo
VIH/sida, em particular pela infeção do VIH tipo 2.  Esta descoberta,
feita em colaboração com a equipa do Prof. José Luis Champalimaud, do Hospital
de Egas Moniz, veio revolucionar o mundo do diagnóstico serológico e contribuiu
para que Portugal e a Unidade de Retrovírus e Infeções associadas (URIA) se
expandisse e concentrasse importantes linhas de investigação na área dos
retrovírus.  Esta Unidade de Investigação da Faculdade de Farmácia da
Universidade de Lisboa tem sido consistentemente avaliada com a classificação
de excelente pelos painéis internacionais da Fundação para a Ciência e
Tecnologia.

A Professora Maria
Odette Santos Ferreira foi coordenadora do Programa Nacional de Luta Contra a
SIDA entre 1992 e 2000. Neste âmbito desenvolveu inúmeros projetos e represenou
Portugal ao mais alto nível das instâncias da saúde internacionais.

O projeto da sua
autoria, de maior impacto nacional e internacional foi, sem dúvida, o projeto
de troca de seringas nas farmácias, denominado “Diz não a uma seringa em
segunda mão”. Foi considerado pela Comissão Europeia o melhor projeto
apresentado por um país comunitário não só pela inovação, mas por ter sido
possível desenvolvê-lo, simultaneamente, em todo o território português,
através das cerca de 2500 farmácias. Este projeto resultou de uma parceria
entre o Ministério da Saúde e a Associação Nacional das Farmácias.  Este
programa tinha como finalidade diminuir o risco de transmissão do VIH e de
outras doenças transmissíveis (hepatite B e C) à população toxicodependente por
via endovenosa.

Outros projetos de
impacto significativo na saúde pública foram, respetivamente, a criação dos
Centros de Rastreio anónimos e gratuitos, a criação de um centro de drop-in no
Intendente, em Lisboa, dirigido às trabalhadoras do sexo, com serviços de
aconselhamento, análises, consultas e proteção.

É ainda responsável
pela criação do programa CRIA – Programa Conhecer, Responsabilizar, Informar,
Agir” de âmbito nacional em 1997 que promove projetos e ações integradas na
Luta Contra a SIDA, mediante o conhecimento e informação sobre a doença e a
participação efetiva da comunidade e dos grupos alvo na definição e
concretização das medidas que possibilitem a melhoria da qualidade da vida das
pessoas infetadas.

De destacar ainda a
coordenação das Redes Comunitárias de Apoio que operacionaliza a nível
nacional, enquanto coordenadora da Comissão Nacional de Luta Contra a SIDA.
Estas redes, desenvolvidas em todos os países comunitários, foram as seguintes:

Rede AIDS e
Mobilidade, Rede Prevenção da SIDA e Hepatites nas prisões, Rede Children and
Family, Rede Sida-Empresas, Rede European AIDS data SET, Rede Minorias Étnicas,
Rede Europeia SIDA e Mulheres entre outras.

Ainda no âmbito da
Luta Contra a SIDA, promoveu vários serviços de apoio domiciliário coordenado
pelo Projeto Solidariedade da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, a construção
da 2ª residência para apoio a doentes com SIDA em situação precária e cria a
primeira unidade de cuidados paliativos para indivíduos com VIH SIDA na cidade
de Lisboa (Residência Madre Teresa de Calcutá).

Promoveu também a
criação das Comissões Distritais de Luta Contra a SIDA, comissões essas que
integram representantes dos sectores da saúde, segurança social, educação e
juventude coordenados pelos presidentes das ARS respetivas.

Promoveu a reabertura
da Linha SIDA e desenvolve inúmeras atividades, de reconhecido mérito, com a
finalidade de melhorar a qualidade de vida dos doentes hospitalizados infetados
pelo VIH SIDA, garantindo simultaneamente a proteção dos profissionais de
saúde.

Ainda em vida, foi
alvo de variadíssimos prémios, distinções e homenagens. Entre outras, foi
nomeada pelo governo francês, em 1975, “Chevalier dans l’Ordre des Palmes
Academiques”, pelo seu desempenho no fortalecimento da cooperação científica
entre Portugal e França, e, em 1987, “Chevalier de la Légion d’Honneur”, pelo
talento e mérito que a levaram a uma descoberta da maior relevância no quadro
das investigações da sida.

Em Portugal, foi
agraciada pela Presidência da República, em 1988, com o “Grau de Comendador da
Ordem Militar de Sant’Iago de Espada”, pelo renome internacional granjeado que
muito contribuiu para o prestígio de Portugal. No início deste ano, foi também
condecorada pelo Presidente Marcelo Rebelo de Sousa com a Grã-Cruz da Ordem da
Instrução Pública, o mais alto grau desta Ordem de Mérito portuguesa, que se
destina a galardoar serviços prestados à causa da educação e do ensino.

Em 2016, foi
distinguida pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (MCTES)
com a Medalha de Mérito pelo seu “valioso e excecional contributo para o
desenvolvimento da ciência ou da cultura científica em Portugal”.

Também a Ordem dos
Farmacêuticos reconheceu o seu vasto trabalho, prestígio e dedicação à
profissão atribuindo-lhe, em 1989, a sua Medalha de Honra, e, em 2012 a Medalha
de Ouro da Ordem dos Farmacêuticos. Com o propósito de contribuir para a
promoção e dinamização da investigação em Saúde Pública por farmacêuticos em
Portugal, a Ordem dos Farmacêuticos criou ainda, em 2010, um prémio de
investigação científica com o seu nome, designado por Prémio de Investigação
Científica Professora Doutora Maria Odette Santos-Ferreira.

Odette Ferreira foi
agraciada com o Prémio Universidade de Lisboa em 2006 e recebeu, em 2013, o
colar do Prémio Nacional de Saúde.

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