A Comissão de Saúde da Assembleia da República realizou ontem uma audição à presidente do Conselho de Administração do Instituto Português de Oncologia (IPO) de Lisboa, Eva Falcão, e à diretora dos Serviços Farmacêuticos, Rute Varela, na sequência das denuncias e escusas de responsabilidade apresentadas pela equipa de farmacêuticos, e do pedido de demissão da sua diretora, que alegam falta de recursos humanos e materiais na farmácia hospitalar, que ameaçam a qualidade e a segurança dos cuidados prestados aos doentes.
As duas responsáveis do IPO apresentaram dados distintos sobre a atividade dos serviços farmacêuticos hospitalares. A presidente referiu que o IPO conta atualmente com 18 farmacêuticos, mais quatro do que no final do ano passado. “Quer isto dizer que, de facto, a farmácia tem sido reforçada, não há recusas de autorizações de contratações por parte do Conselho de Administração”, garantiu a responsável.
Contudo, a diretora dos Serviços Farmacêuticos explicou que estes ” dados não são corretos” porque o Conselho de Administração não está a contabilizar os farmacêuticos contratados como técnicos superiores de saúde.
“Posso dizer que em 2018 tínhamos 22 farmacêuticos e neste momento temos 23”, assegurou. Rute Varela explicou que os serviços farmacêuticos têm “exatamente o mesmo número de recursos” do que há cinco anos, mas chamou a atenção para o considerável aumento de produção e complexidade dos tratamentos inovadores.
Em 2018, foram preparados 38.529 tratamentos [de quimioterapia] enquanto em agosto de 2023 já tinham sido preparados 29.318, prevendo-se que no final do ano sejam 44.000 tratamentos, estimou Rute Varela, sublinhando um acréscimo de 6.000 tratamentos neste período de 2018 para 2023.
De acordo com o relatório da inspeção realizada pelo Infarmed aos serviços farmacêuticos do IPO de Lisboa, foram detetadas 14 não-conformidades classificadas como críticas, 10 das quais referentes às condições de trabalho, pressões, humidades e temperaturas.
A autoridade reguladora detetou que não são “assegurados os diferenciais de pressão entre o corredor da área limpa e as salas de preparação”, nomeadamente as salas de alimentação parentérica e salas de preparação citotóxicos. Constatou também que o sistema de gestão técnica centralizada está avariado desde final de 2022 e a existência de manómetros analógicos nas diferentes salas sem estarem identificados e calibrados.
No relatório a que a Lusa teve acesso, o Infarmed alerta ainda para a falta de “dupla verificação de operações críticas durante a preparação de citotóxicos” e para o não funcionamento do dispositivo de controlo de acesso à zona de preparação de estéreis.
Entre as não conformidades, estão ainda “as salas de preparação, que não tinham sonda de monitorização de temperatura e humidade relativa” e “não se encontravam a utilizar detergente estéril na limpeza das salas de preparação”.
O Infarmed alerta ainda que os dispositivos médicos utilizados no IPO de Lisboa não estão sob responsabilidade dos Serviços Farmacêuticos, com exceção do que têm ação terapêutica e dá ainda nota sobre a desinfeção de material, que não está a ser realizada previamente à colocação na ‘passbox’ para a sala de preparação.
O Infarmed concedeu um prazo de 10 dias úteis ao IPO para apresentar um plano de medidas corretivas para as não-conformidades críticas e maiores e 30 dias paras as outras, devendo anexar documentos probatórios das medidas corretivas que venham a ser implementadas.
Esta inspeção foi realizada depois de o bastonário da Ordem dos Farmacêuticos, Hélder Mota Filipe, ter pedido em outubro a intervenção da autoridade reguladora para garantir o cumprimento de boas práticas na preparação de medicamentos no IPO de Lisboa, depois de ter recebido pedidos de escusa de todos os farmacêuticos da instituição.